sábado, 30 de abril de 2011

Chuchu

- O que é que está escrevendo?

- A lista da feira de amanhã. Falando nisso, chuchu é com xis ou ceagá?

- Ceagá Flavinha, ceagá.

- Escrevi com xis, mas vai ficar assim mesmo.

- Corrige isso.

- Não! Escrevo assim há muito tempo, a Ângela é capaz de não entender com ceagá e vai me trazer caqui no lugar do chuchu.

- Contribuindo para a ignorância do povo, que vergonha! Não é melhor ensinar a ela como se escreve?

- Deixa prá lá, não complica...

- Mas afinal de contas você não fez pedagogia?

- Não debocha, Zé! E já fazem uns 15 anos que me formei, já esqueci tudo.

- Esqueceu até a concordância. É “faz 15 anos” que se diz.

- Ah, essa eu sabia, falei só pra ver se você estava ligado.

- Dói muito escutar barbaridades. Estou sempre ligado nelas.

- Eu sei, nada passa desapercebido por você.

- Despercebido. Desapercebido quer dizer desprevenido.

- Xiiii... Vai começar o furor corretivo? Por que que ao invés de ficar aí corrigindo as pessoas você não escreve um livro de gramática?

- Porque tudo que eu falo já foi escrito várias vezes e por vários autores, e por coincidência, todos eles dizem que no caso da sua última frase não se usa “ao invés de”, que significa ao contrário. O certo seria “em vez de” que indica substituição.

- Zé, como você é chato! Não sei por que você se formou em computação. Ao meu ver deveria ter feito letras. Ia ser um bom professor de português, chato pra cacete, mas bom.

- Flavinha, como é que eu vou fazer pra não ser chato com você se a sua torneirinha de asneiras insiste em jorrar besteiras? Parece até de propósito! Não é “ao meu ver” e sim “a meu ver”.

- É de propósito sim senhor! Ou você acha que eu falo besteira assim, sem parar?

- Às vezes a gente nem nota e escorrega. A língua portuguesa é meio complicada.

- Eu sei, eu sei, mas você exagera! Entre eu e você, tudo bem, mas lembra aquela vez em que você assim que chegou em São Paulo, entrou no táxi e começou a esculhambar o motorista só porque ele perguntou “onde nóis vai”? Qualquer hora você apanha!

- Flavinha, pelo amor de Deus, não abusa da minha paciência...

- Ué, por que?

- Não é “entre eu e você” e sim “entre mim e você”, e também não se fala chegar em São Paulo e sim a São Paulo.

- Grrrrr... Ainda bem que a novela já já acaba e começa o futebol. Você não vai assistir ao jogo e me dar sossego?

- Vou. Mas só que vou assistir “o jogo” e não “ao jogo”...

- Olha, eu não vejo qualquer graça no que está fazendo comigo. Vai gozar com a sua mãe!

- Mas você não pára! É “nenhuma graça” e não “qualquer graça” que se usa, e também não vou “gozar com a mamãe” porque seria incesto, e ela já está meio velhinha pra isso. No máximo posso “gozar a mamãe”.

- Ô poço de pentelho! Depois nega que é chato!

- Nega que “seja” chato...

- Ah, pára! Você sequer me dá tempo pra respirar!

- Nem sequer, o certo é nem sequer. Sequer deve se usar com negativa.

- Quer saber de uma coisa? Vai se efe ú dê é erre!

- É efe ó dê é erre, é foder que se escreve...