- O próximo!
- É eu!
- Seu nome, por favor.
- Adilsom.
- Com “ene”?
- Não, senão fica Nadilsom, né?
- No final, senhor.
- No final de que? Eu já esperei tanto tempo aqui nessa fila e vou ter que voltar pro final?
- Perguntei se o seu nome tinha “ene” no final.
- Ah, não! Com “mê”.
- O que mais?
- Mais nada, ué. “A”, “dê”, “i”, “lê”, “si”, “o”, “mê”.
- O nome, senhor. Nome completo.
- Ah, sim. Adilsom dos Santos Bezerra.
- Endereço?
- De onde?
- Da sua residência.
- Qual delas?
- Como qual delas? O senhor tem mais de uma?
- Tenho duas. Uma em São Gonçalo e outra em Caxias.
- Mas onde o senhor mora?
- Nas duas. De segunda a quinta em Caxias e de sexta a domingo em São Gonçalo. A senhora sabe, né? Uma é de lei, onde moro com minha mulher de papel, e a outra é contrabando.
- Mulher de papel, como assim?
- É. Casei com a Neusa, e tenho a Eliete de amália.
- O senhor quer dizer amásia, não é?
- Isso, isso.
- Então me dê o endereço da sua esposa, a do papel.
- Ih, esse não sei não! É numa favela nova, nem sei se tem nome. Mudei faz pouco.
- Então o da outra.
- Que outra?
- Da amásia, seu Adilsom...
- Não é outra não, é a mesma desde oitenta e sete.
- Eu sei, seu Adilsom, diga o endereço dela, por favor.
- E como é que a senhora sabe que eu estou com ela esse tempão todo?
- Quem disse que eu sei, seu Adilsom? Eu só quis dizer que sabia que era da dona Eliete...
- Sei lá, dona! Esses computador tem coisa que só o cão sabe!
- O endereço, por favor. Olha o tempo!
- Tá chovendo, a senhora vai ter que...
- O tempo do relógio! Eu quero o endereço!
- Calma, eu num tava entendendo! É rua C, casa 45, quadra 7, lote 2.
- Bairro.
- Jardim Liberato.
- Cidade?
- Caxias.
- CEP.
- Hem?
- O número do CEP da casa.
- Sei o que é isso não...
- Deixa, eu procuro depois. O senhor nasceu onde?
- Em casa, eu e meus irmão tudo. A parteira foi a mesma que...
- A cidade, seu Adilsom!
- Ah, num foi na cidade, foi na roça mesmo.
- O município, então.
- Sei não.
- O nome da cidade mais perto então.
- Perto de onde?
- De onde o senhor nasceu.
- Coxixola.
- O senhor tem certeza que existe essa cidade?
- Bom, até eu vir aqui pro Rio ela existia.
- E onde ela fica?
- Pertim de onde eu nasci.
- Eu sei, mas em que estado fica?
- Paraíba.
- Sexo masculino...
- Muito macho sim senhora! Tenho sete fi...
- Por favor, seu Adilsom! De quanto o senhor precisa?
- Preciso pra que?
- O empréstimo! De quanto é?
- Uai, é tão caro assim pra eu precisar empréstimo?
- Caro o que, seu Adilsom?
- Pra entrar no banheiro.
- Que banheiro?
- Vocês não têm banheiro aqui?
- Tem, claro! É ali atrás, mas não entendo o que isso tem a ver com o empréstimo.
- Eu também não. Eu queria só perguntar onde era o banheiro, mas a senhora veio logo querendo saber um monte de coisa... Eu quero mesmo é dar uma boa barrigada. Dá licença que tá brabo, depois a gente conversa do tal do empréstimo.